quinta-feira, 30 de novembro de 2017

Mário Centeno

Ainda não consegui perceber o entusiasmo com a putativa ida de Mário Centeno para a liderança do Eurogrupo. Se até Jeroen Dijsselbloem conseguiu lá chegar, por que motivo um doutorado por Harvard há-de regozijar-se por tal hipótese? Depois, um português chegar a um cargo desses na UE é tão natural como um algarvio ou um ribatejano chegarem a ministros da República. Isso é motivo de excitação? Esta gente não tem mais nada para fazer?

quarta-feira, 29 de novembro de 2017

Ramalho Eanes

Hoje foi lançada uma biografia autorizada de Ramalho Eanes. Tenho uma apreciação globalmente positiva da sua acção política. Contudo, nem tudo foi luminoso. A história do PRD parece-me uma nódoa no currículo que ele deveria ter evitado. Exceptuando isso, não teria sido mau para a democracia portuguesa que as elites políticas que tomaram conta do país tivessem o respeito que o general sempre evidenciou pela res publica e pelos interesses do país. Hoje Portugal estaria francamente melhor e teria, apesar das vicissitudes internacionais, evitado a aventura da troika. E não há maior homenagem que um cidadão possa prestar a um antigo governante do que apontá-lo como exemplo cívico. Um dos grandes da nossa democracia.

terça-feira, 28 de novembro de 2017

Crony capitalism

Ver o arrufo entre o governo e o BE, sobre as rendas da EDP, como um problema interno das esquerdas é querer tapar o sol com a peneira. Independentemente do acerto da solução proposta pelo BE, o que ficou claro, mais uma vez, é a impotência, para não dizer cumplicidade, dos partidos do arco governativo perante os grandes interesses. O hooliganismo político que grassa nas redes sociais entretém-se muito com a divisão entre direita e esquerda. Na verdade, em Portugal, como em muitos outros países ocidentais, essa divisão é, na prática, fictícia. Governe a direita ou governe a esquerda, quem manda são os mesmos. Antes de haver espaço para um verdadeiro confronto entre projectos de direita e de esquerda é necessário limpar o terreno deste inaceitável conúbio entre política e interesses económicos. Só a partir dessa limpeza faz sentido discutir se a sociedade deve ser mais liberal ou mais social-democrata. Até lá, não passa de um crony capitalism, como se tornou a ver neste arrufo.

sábado, 25 de novembro de 2017

Cansativo

Não me comovem os ataques que a direita faz a esta iniciativa (ver aqui). Isto, ou coisa semelhante, é uma parolice que um qualquer governo de direita seria capaz de fazer. A parolice está democraticamente distribuída. O que não me deixa de espantar, contudo, é a insistência de António Costa, nos últimos tempos, em coisas estúpidas, sem qualquer benefício político e que têm o condão de dar assunto à oposição para fazer um drama. Do ponto de vista do cidadão, estas coisas são inadmissíveis. A oposição faz o seu papel e ainda bem. Há contudo, um outro problema. É uma certa cultura de novo-rico que se instalou nas elites governantes. Estão tão extasiadas com o terem chegado ao poder, que, ao assumi-lo, o cérebro fica toldado e acham que tudo é possível. Eu não sou favorável ao Estado mínimo, mas sou um adepto do Estado frugal. Gastar apenas no que é estritamente necessário e depois de grande ponderação. O António Costa não arranja pessoas normais e sensatas que o aconselhem? Por exemplo, alguém que perceba as consequências políticas negativas de cada uma das ideias geniais que afloram naquelas cabeças. Isto está a tornar-se cansativo.

sexta-feira, 24 de novembro de 2017

Um problema

O Islão é um problema. Não porque todos os adeptos dessa religião sejam terroristas ou queiram impor a sua religião a outros, mas porque existem grupos militantes que estão dispostos a tudo, mesmo a matar outros adeptos do Islão. Neste momento, o Islão militante é o principal problema do mundo. O assassinato, no Egipto, de fiéis sufi é revelador (ver aqui). Os sufi, um ramo espiritual do Islão, pela natureza da sua prática religiosa são os que estão mais abertos à aceitação da diferença e à tolerância. Para o Islão militante não há tolerância possível. A morte é a única lei que os rege. Se isto não é um problema, o que é um problema?

quinta-feira, 23 de novembro de 2017

O pescoço a jeito

Os tempos não correm de feição a António Costa e ele também não ajuda. Tancos, os incêndios, a legionella. A lei de Murphy tomou-o de ponta e, como se sabe, qualquer coisa que possa ocorrer mal, ocorrerá mal, no pior momento possível. E assim se tem cumprido. Por outro lado, les compagnons de route estão apostados em que a route regional não se transforme em auto-estrada, e vão de criar uns quantos problemas ali mesmo onde a coisa dói, isto é, na função pública. Com o Murphy e os compagnons indispostos, o próprio António Costa e o governo decidiram pôr o pescoço a jeito. Não bastava a desorientação na segunda vaga de incêndios, como agora fazem, nem Deus sabe porquê, transferências avulsas como o Infarmed. Ainda não perceberam que, nas actuais circunstâncias, o melhor que o governo deve fazer é fazer-se de morto. Houve um momento em que parecia que havia ali alguém que pensava, mas ou reformou-se, ou emigrou para a Europa.

segunda-feira, 20 de novembro de 2017

Agência Europeia do Medicamento

Quando se colocou a questão da transferência da Agência Europeia do Medicamento para fora do Reino Unido, devido ao Brexit, falou-se de Lisboa e das possibilidades que ela teria de ser escolhida. Isso desencadeou, em Portugal, uma campanha contra a candidatura de Lisboa. O governo, que tinha a obrigação de saber que o peso de uma candidatura do Porto era muito menor que o da candidatura de Lisboa, em vez de ser firme na sua intenção, cedeu ao vociferar de Rui Moreira. O resultado é que a agência irá ou para Milão, ou para Amesterdão, ou para Copenhaga (ver aqui). Como se percebe ficámos todos a ganhar.

domingo, 19 de novembro de 2017

A vociferação

Com a questão das progressões na carreira pelos professores, a esquerda enrolou-se sobre si mesma e, se não houver um módico de inteligência, está a preparar o caminho para o retorno em força da direita. Mesmo que o acordo entre governo e sindicatos de professores seja uma mão cheia de nada e outra de coisa nenhuma, a vociferação de outros corpos da função pública representa um desgaste político contínuo para a actual solução governativa, desgaste que parece não ter fim à vista. O que se está a passar mostra os limites ideológicos dos grupos políticos que apoiam a actual situação. Por um lado, os partidos que estão fora do governo, continuam presos a lógicas particulares, incapazes de olharem para o país como um todo que tem de viver num ambiente que não determina e que é altamente ameaçador. Por outro, o partido do governo, dividido entre a responsabilidade perante a União Europeia, a falta de uma legitimidade política inequívoca e a leviandade que, desde há muito, é imagem de marca dos socialistas, mostra-se atarantado, sem saber que rumo tomar. A esquerda parece que ainda não percebeu que os grande problemas do país não são os rendimentos dos professores, dos médicos, dos militares ou da função pública em geral. E se não percebeu isso, não percebeu nada. A esquerda tem tido tudo na mão. Se falhar, não se pode queixar a não ser de si mesma. E se ela falhar, serão os seus eleitores, e não as elites políticas de esquerda, que pagarão duramente o falhanço.

sexta-feira, 17 de novembro de 2017

Um paternalismo perigoso

Há dias referi que o papel de provedor do cidadão que Marcelo Rebelo de Sousa tem feito é útil. Referia-me a casos como os de Tancos ou da Legionella. Nestes e noutros semelhantes, isso é aceitável e benéfico. Outra coisa é comentar todas as decisões políticas do governo. As que lhe agradam ou as que lhe desagradam. Na prática, está a desenhar um paternalismo, em relação à governação, à oposição e aos cidadãos, que não é compatível com uma democracia liberal. Este paternalismo assenta numa coisa perigosa para a cidadania e para a democracia: a ideia de que a posição do PR é a verdade sobre um determinado assunto. Isso é aniquilar a democracia. Imaginemos que, no caso do prolongamento até 23 de Novembro do período crítico de incêndios, a decisão do governo gerava discórdia na oposição. O comentário de Marcelo Rebelo de Sousa aniquilaria de imediato o debate político e o papel da oposição. Condicionaria também a opinião dos cidadãos. Isto é perigoso.

quarta-feira, 15 de novembro de 2017

O provedor

Para lá do estilo, pelo qual não tenho particular admiração, e da visão ideológica que tem do mundo, que também não partilho, este trabalho de provedor do cidadão, que Marcelo Rebelo de Sousa está a fazer, é meritório. À sua maneira, um pouco histriónica, tenta colmatar alguns défices da nossa democracia. Por exemplo, a contínua tentação das elites governantes em não prestar contas, em deixar tudo o que é desagradável morrer como se não tivesse acontecido nada. Um Presidente da República não é um provedor do cidadão. Contudo, numa democracia como a nossa, onde a herança do autoritarismo aparece nos lugares mais insuspeitos, o papel não é inútil e acaba por proteger o regime de algumas tentações.

domingo, 12 de novembro de 2017

Debate político

O debate político em Portugal é miserável. Está cheio de casos, uns graves, outros anedóticos. Mas sempre e só casos. A nossa política não passa de uma casuística insana. Poder-se-ia pensar que isso se deve ao ardil dos políticos que fogem, para não perder votos, dos assuntos sérios como o diabo da cruz. Mera ilusão. A casuística e o anedotário, conjugados com a tonalidade da indignação, são as únicas ferramentas que a generalidade dispõe para arremessar ao outro lado. Um debate sério exige muito conhecimento, muito estudo e muito esforço. Ora, quem está disponível para tanta perda de energia?

sábado, 11 de novembro de 2017

Perguntem ao Putin

Nem percebo como isto não ocorreu aos responsáveis pela investigação da alegada interferência russa nas eleições americanas, que teria tido por finalidade eleger Donald Trump. Em vez de perderem tempo e dinheiro em investigação, perguntavam: Sr. Presidente, acha que os russos interferiram nas eleições a seu favor? Trump responderia: olhe, pergunte ao Putin. Ele dir-lhe-á a verdade e fica tudo resolvido. Não há nada como perguntar ao Putin (ver aqui)).

sexta-feira, 10 de novembro de 2017

Vichyssoise

Há coisas que nem Marcelo Rebelo de Sousa pode dizer. Todos sabemos que ele é muito afectuoso, nada num mar de ternuras e inclinações, e que lhe foge a retórica para a divagação familiar. Aquilo que, todavia, nem ao tinhoso do belzebu lembra, lembra ao actual Presidente da República. Entusiasma-se, entusiasma-se, e lá deixa sair alguma coisa que ou está escondida no recôndito da alma ou em que ele acredita como acreditava na vichyssoise que vendeu a Paulo Portas. Pródigo tanto no ditirambo como no encómio, perante a figura da esposa do Professor Aníbal Silva, não se conteve e nomeou-a, a posteriori, madrinha dos portugueses, pelo menos durante 20 anos. Temo que, se for convidado para alguma homenagem à senhora Lurdes Rodrigues, aquela que pastoreou os professores, no tempo do senhor Sócrates, ainda a designe como a mãe dos professores portugueses, se não mesmo o seu anjo protector. Às vezes, era melhor que o Presidente em vez de abrir a boca para falar fosse para introduzir uma colher de vichyssoise.

quinta-feira, 9 de novembro de 2017

O desvelo

Confesso que o ministro Rodrigues, o rapaz que, segundo o organograma (nem sei onde foram inventar esta espécie de palavra) governamental, ocupa a pasta de Educação, embora tenha ouvido dizer que não passa de um heterónimo do secretário de Estado Costa, confesso, dizia eu, que ele não me interessa para nada. Não partilho a sua visão da educação (caso a actual visão seja a dele), não porque esteja em abstracto errada, não está, mas por outros motivos que não vêm ao caso. Fico, porém, perplexo pelo súbito desvelo de Assunção Cristas para com os professores e o ataque ao ministro, por este teimar numa ideia que o governo, onde a senhora pastoreou a Agricultura, pôs em prática com grande determinação e não pouca rispidez (ver aqui).

quarta-feira, 8 de novembro de 2017

Pressões

Enfermeiros, médicos, juízes e, agora, professores. O êxito de António Costa está a transformar-se nos ingredientes que começam a cavar a sua derrota e com ele a da esquerda. As contas de Mário Centeno têm feito milagres, mas o milagre só pode persistir dentro da frugalidade e da contenção da despesa. Depois dos fogos, esta pressão sobre o orçamento, a que se aliará a eleição de um novo chefe da oposição, começam a abrir caminho para o retorno da direita ao poder, mais depressa do que se pensa. Percebe-se que enfermeiros, médicos e juízes façam o que estão a fazer. São intocáveis, seja qual for o governo. Quanto aos professores, parece que ainda não perceberam o que lhes vai acontecer quando a direita voltar ao poder. Já se esqueceram dos últimos tempos do Crato. 

terça-feira, 7 de novembro de 2017

Revolução bolchevique

O que dizer dos 100 anos da tomada de poder pelos bolcheviques russos? A muita gente ocorrerá grandes encómios, a muita outra ferozes censuras. A mim ocorre-me que a facilidade com que os comunistas russos tomaram o Palácio de Inverno é idêntica àquela com que saíram de lá. O mundo nunca deixa de surpreender.

domingo, 5 de novembro de 2017

O fastio e o enjoo

Por desfastio, alguém nos EUA lembrou-se de descarregar uma arma para entro de uma Igreja Baptista. Vinte e sete mortos. Também para não enjoar, foram encontrados investimentos, em offshores, da rainha Isabel II e de alguém ligado à administração Trump. Como se vê, há múltiplas e criativas formas de combater o fastio e o enjoo. Sob o Sol - ou a Lua - nada de novo. Talvez, ao contrário do que que pensava o velho William, não haja mais coisas entre o céu e a terra do aquilo que pode imaginar nossa vã filosofia. Talvez não. O pior, porém, é o fastio e o enjoo.

sábado, 4 de novembro de 2017

Ferramentas

O processo de dessacralização das sociedades ocidentais foi acompanhado por um processo de sacralização das ideologias políticas. Esquerda e Direita são vistas, pelos respectivos adeptos, como espaços sagrados, nos quais cabem, por certo, diversos credos e diferentes liturgias. Uma leitura racional da dicotomia política mostra-nos, porém, que Direita e Esquerda são meras ferramentas que certas sociedades, como um todo, usam com a finalidade da autopreservação e da persistência no tempo.

O carácter sacral desses espaços devia chamar a atenção, de quem olha racionalmente a questão política, para o investimento que a espécie faz, em certo tipo de sociedades, nessa organização dicotómica. A sua sacralização não é outra coisa senão a criação de uma ilusão que visa preservar essas ferramentas. No entanto, essa ilusão revela uma outra coisa.

Direita e Esquerda não têm, por si mesmas, qualquer valor intrínseco. O seu valor é meramente instrumental. São ferramentas que os cidadãos, enquanto comunidade, usam para regular a sua vida comum. Talvez a maior parte dos cidadãos necessite da ilusão, necessite de perceber na Direita ou na Esquerda um valor sagrado. Se queremos, porém, pensar o fenómeno político, devemos deixar de lado a ilusão e olhar Esquerda e Direita como o esquadro ou o formão dos carpinteiros. Meras ferramentas a usar. 

sexta-feira, 3 de novembro de 2017

Jerónimo de Sousa

Não estará longe o dia em que o PCP terá de substituir Jerónimo de Sousa à frente do partido. Não será um pequeno problema. É verdade que os comunistas vivem fixados na imagem do Dr. Álvaro Cunhal, a quem, talvez para sublinhar uma proximidade que nunca existiu, chamam apenas Álvaro. No entanto, Cunhal que nem dos comunistas foi próximo, pelas suas características psicológicas, pelo seu ar aristocrático e distante, pela sua preparação política e pela sua inteligência penetrante, sempre foi um estranho – por vezes, um inimigo – para a generalidade dos portugueses não comunistas. Jerónimo de Sousa, não ostentando as capacidades de Cunhal, conseguiu estabelecer uma relação normal do Partido Comunista com o país. A afabilidade, a honestidade e a humildade do actual secretário geral dos comunistas foram essenciais não apenas para que o PCP fosse olhado de forma mais benevolente pelos portugueses não comunistas, como se tornasse um partido com real influência na governação do país. Todos sabemos que o fim da URSS contribuiu, e muito, para isso, mas a figura de Jerónimo de Sousa foi fulcral para uma subtil, mas decisiva, mudança da imagem dos comunistas portugueses. Substituir o antigo operário não vai ser fácil.

quinta-feira, 2 de novembro de 2017

A emenda e o soneto

A situação em Espanha, devido à Catalunha, agrava-se a cada lance. E não é fácil. De facto, estes presos são presos políticos (ver aqui). Cometeram um crime contra a ordem constitucional, é verdade (mas podem argumentar que Gandhi, Mandela, os Timorenses de Leste, por exemplo, cometeram crimes contra as ordens constitucionais em que viviam), mas não houve qualquer violência, qualquer delito comum (sim, eu sei que são acusados de peculato, mas isso é ainda uma acusação política). Se se confirmar aquilo que parece ser neste momento a tendência das sondagens (crescimento do independentismo, segundo o La Vanguardia), o que vai Espanha fazer? Se um novo governo pró-independência declarar mais uma vez de forma unilateral a independência, o que faz Madrid? Activa o artigo 155 de novo? Manda prender os novos dirigentes e convoca novas eleições? A jogada de Rajoy pareceu inteligente pela rapidez, mas é um grande risco. E estas prisões - no âmbito da lei em vigor, diga-se - podem ser, para os interesses de Madrid, uma emenda pior que soneto.